11 de agosto de 2009

Passos largos pela rua escura, com dois ou três bêbados velhos e desconhecidos no bar da esquina. Eles gritam e se divertem, mexendo os braços pra lá e pra cá, e a boca babando uma saliva que eu diria ser de areia.
Como eu, secos. Esgotados pela noite que ainda viria, pouco desinteressados pela vida, mas isso não nunca falariam.
Essa obrigação que se tem de gostar de viver me abateu já há algum tempo. É realmente maravilhoso. Era tudo que eu queria. Sim, a realização de um sonho profundo que eu tinha quando ainda voava acima do universo, e não era conhecida de minha mãe, e esperava.
Todos esses olhos que não sabem de onde vêm, e porquê. Me deprimem quando bebem seus cotidianos. E tentam alienar-se do simples fato de que estão aqui e que não há mais nada a ser feito.
Talvez percamos tempo demais tentando. Talvez seja melhor ir embora. Para a congregação dos espíritos da eternidade. Encontrar velhos amigos, velhos conhecidos, que espero, agora trazem em seus corações pouco mais de paz e consolo para mim.
Ou, não sei, qualquer outra coisa. Qualquer outra coisa. Porque não sou realmente boa, e definitivamente não necessária a qualquer coisa ou alguém, logo, estou livre pra partir. Ninguém é insubstituível, é o que dizem.
O Pai, invejoso, tirou-me a mãe e me jogou num mar de nuvens onde eu sou a Besta que sou. Quero encontrar o que me precede, a forma motora que me impulsiona. No vácuo. E fechar os olhos junto ao corpo todo. Dormir. Voltar ao lugar de onde vim, e pra onde vou, quando eu descobrir o caminho.
Eu não tenho duvida de que estamos todos mortos.
Tem mais vida no saco de pipoca doce que se virou e revirou quando ventava, ontem, no recuo perto da igreja na São Clemente. Só eu vi. E depois o vitral refletiu com santidade as bandeiras coloridas que se agitavam.
É o suficiente. Não há mais nada que falte. Eu estou dispensada.

3 de agosto de 2009

Walk proudly, William Blake.

Salomé sabe o que quer.

Engole o teu orgulho, João Batista, porque és um homem e nada mais.
E todo homem nasceu pra uma mulher; nasceste pra mim!
Teu deus já não precisa de novos mortos. Sou eu quem não pode te perder.
E deus não está olhando.



E que sinto e o que vejo, e porque as coisas parecem assim como parecem, pelo menos a mim, que sou filha de quem sou filha, irmã de quem sou irmã, e assim como sou. Hei de sempre estar no cometa que é a idéia que passa para o campo da existência material. Quando o que não era, se torna, e é agora, mas mais pra frente não mais será. Toda essa instantaneidade dos momentos, e a fluidez com que as coisas são e deixam de ser me detonam com uma euforia feroz, e eu me vejo tagarelar aquilo que não devia, e perder-me nos corredores de minha própria casa, como se labirinto ela fosse, entre um café e outro. Tudo passa, mas meu peito não esquece e quer sempre repetir. Se é isso que me faz humana, preferia não sê-lo. Pois é uma confusão de considerações e parece que estou espirando mais do que mais tarde poderei expirar. E fica um monte disso ainda dentro de mim de uma forma que me toma o espaço de Ser em mim e acabo sendo metade parte irreconhecível da vida, que passa e abandona, que não já existe mais, mas que em mim fixa-se, ainda que deformada do que era ou do que um dia virá a ser, se deus tiver misericórdia e os saberes dos tempos coincidirem com essas expectativas.
Mas na verdade nada disso é realmente importante. Sendo ou não sendo, tudo há de ser como deve ser e eu creio no destino e na perfeição benevolente. Não é que eu queira amarrar a vida e cristalizar uma OBRA de entulhos especulativos. Só que estou... sendo... um pouco... triste. Fumando um cigarro atrás do outro e não querendo sair pelas ruas porque não quero ver o que de mim não faz parte, pois há um ano ou mais travei uma guerra comigo mesma pela minha independência. Mesmo sem saber que possível sentido lógico isso poderia ter. Foi-me importa por mim essa guerra, e mesmo sem querer acabo sendo complacente comigo tanto em minhas derrotas quanto em minhas vitórias. Pois sou eu, e não sei ver-me de fora. E parece que quanto mais eu desço mais me perco no egoísmo existencialista que é querer superar-se e ter uma existência ainda mais radiante, mesmo que na simplicidade. É um disfarce, pois não há nada que não seja simples, então, querendo ou não, e mesmo sendo megalômana como sou, a simplicidade nunca haveria de sair dos meus planos.
Tenho alguns amigos e quando estamos bem eles me bastam. Mas quando não estamos não me bastam, e eu mesma não me suporto. Queria que alguém me definisse o que é bastar-se em si, e ser independente. Estar no mesmo lugar é uma opção, não é? Querer-se a si, e a vida, e reproduzir-se, envelhecer, aborrecer-se, chorar, rir ou ser indiferente.
Se a praia me passa na imagem da mente devo ela buscar ou devo me contentar com sua imagem? Se não compartilho o que de mim noto, sou mesmo isso que noto? Se não decido ser como sou, e apenas sou, mesmo que me preocupando com o que sou e com que não optei ser, quem sou? Sou um querer falido ou a vitória do instante espontâneo? Sou para quem? Alguns são para os outros, outros são para um sonho, outros são para deus. alguns são para uma tradição. Outros quebram essa tradição sendo o que ela não é, e assim são para a quebra dessa tradição – são para serem livres e sentirem essa liberdade de não serem o que o mandaram ser.

Mas eu não tive regras e sendo uma coisa ou outra não sou livre, pois tudo me é permitido. Sou uma bóia em um mar sem redes. Sou um ponto em um céu branco sem fim.
Se não tenho que fazer, não faço. E o que faço, quando não tenho o que fazer, é uma invenção, que se eu não fizesse, não ficaria chateada, pois isso não faria qualquer diferença em mim. posso não fazer nada, mas isso me entedia. E quando faço, também me entedia, pois é qualquer coisa e não significa. Mesmo que eu tente que signifique, não significa. Pois é para nada. E tudo que é para nada poderia não existir.

Acontece que no fundo eu sei que não há coisa que exista que seja para qualquer outra coisa que não para si mesma.
Se eu tenho um isqueiro e o esqueço em uma gaveta por 5 anos, durante 5 anos esse isqueiro continuará sendo um isqueiro, mesmo que não exerça sua função. Só que eu nasci sem função, com nenhuma função. Preferiria ter nascido com uma função, mesmo que ela fosse esquecida. Assim poderia ser pelo menos um esquecimento.
À que me devo.
Por que estou.
Bla bla bla do homem azul.

De alguma forma é divertido, quando não é enlouquecedor. Ou até mortal.