24 de janeiro de 2010

qual o problema de não ter uma boa ideia

O destino pode simplesmente não me alcançar. Eu que fiquei longe demais pro caminho detrás e talvez tenha extrapolado e perdido a medido da estrada. Ribanceira, picos e pinos. O refluxo do avanço. Você diz ser feliz mas eu não sei o que isso significa. Porque ser feliz é ser algo e eu nunca consegui pensar em ser qualquer coisa. A não ser partir. As coisas que saem, que se perdem, eu sou isso.
Harmonia, amor e compaixão. Alimentação sadia. Obstrução de energia. Criação. Comunicação avanço nostalgia. Certo errado. Escolha qualquer. Beleza e poesia. Nada me diz nada. Erupção, irrupção, colapso nervoso. Asma, taquicardia, garganta e nicotina. Ansiolítico para dormir porque amanha tem outro velho dia. Vou pra lá e pra cá e não ligo. Nada me diz nada. Ter uma estrada, um caminho, um dia morrer simplesmente eu não ligo.
Qual o problema de não ter uma boa ideia?

3 de novembro de 2009

paroxetina

Ela precisa disso, não precisa?
Precisa.
E de quê mais?
Só isso.
Ela pode...
Não, não pode saber nada sobre isso.
Ou o quê?
Ela precisa disso e não pode saber.
Ou o quê?
Não importa. Não vamos perder esse tempo supondo o quê poderia acontecer se ela soubesse. Não vai. É melhor assim, pode acreditar.
E por que eu deveria acreditar, se você mesmo não sabe dizer?
Eu poderia dizer muitas coisas, mas eu prefiro não seguir por esse caminho.
Então eu nunca vou saber o que teria acontecido?! Você acha isso justo?
É você quem quer saber, não ela. Você acha justo você saber e não ela?
Acho que eu tenho mais autoridade nessa decisão do que você. você nem conhece ela!
Eu sou um profissional.
E daí? Você não sabe de nada sobre ela.
Você está perdendo a cabeça.
Tem razão. Desculpe, doutor.

Tempo.

Mas porque?
Porque isso geraria uma auto-critica demasiada. Paralisaria.
Auto-critica não é importante?
Nem sempre.
Mas quando favorece o crescimento é importante.
Isso não favoreceria o crescimento.
E não ter noção de si mesmo favoreceria? Que palhaçada.
Ela vai poder fazer todas as coisas que quer, aproveitar os momentos, aproveitar a juventude. Você não gostaria disso?
Sim.
Confie que dará tudo certo.
O que é dar certo?
Viver. Sorrir.
De mentira?
Que seja.

12 de outubro de 2009

quote

"A transição de professor para marinheiro é crue, asseguro-vos, e requer um forte decocto de Sêneca e dos estoicos para habilitar-vos a não senti-la. Mas até isso passa com o tempo. (...) Qual o valor dessa indignidade, se pesada, entendei-o, com a balança do Novo Testamento? Quem nao é escravo? Dizei-me! Ora bem, por mais que os velhos capitães me dêem ordens, por mais que me possam bater e esmurrar, tenho a satisfação de saber que tudo está certo; que todos os outros, deste modo ou daquele, são servidos quase do mesmo jeito, de um ponto de vista físico ou metafísico, aí está; e assim o tapa universal faz a volta e todos deveriam esfrega as costas uns dos outros e ficar contentes."
(pág 26/27. M.D)

10 de outubro de 2009

Você poderia me dizer o que isso significa? O fato de estar só a essa hora da madrugada sem nada que realmente importe à fazer?
Poderia me dizer o que significa só? Sozinho? Solidão? Se deixar só, permitir-se só e ao mesmo tempo não querer-se. Não querer-se também em grupo, ou não querer-se assim, tal qual figura no instante momento, no instante da situação? Não ter-se. Não querer-se, acima de tudo, não querer-se.
De onde vem, pra onde vai? A onda de gigante potencia descontrolada. O que não se vê, não se acha. Outra língua de saberes. O não pertencimento a si. Uma felicidade que não causa inveja, que não faz querer-se a outros, que não interessa. Um pensamento que não interessa, que não responde ao mundo, o indizível momento de solidão que se perpetua, que não se sabe quando nasceu (nasceu talvez contigo, no mesmo ventre, com ele dividiu-se o berço, a mãe e o pai, seus sapatos, suas palavras aprendidas, conquistadas, são as mesmas) que talvez morra depois de você. que o verá morrer, que rirá de você enquanto você morre, enquanto você não quer mais nada lá: ele, ali, imutável, familiar, indecrepto.

Talvez a depressão seja a principal arma contra os jovens revolucionários. Isso qualquer coisa que faz acreditar que não vale a pena querer (querer-se), viver, ousar, não permitindo o desdobramento de um pensamento deslocado, que possa ser nocivo ao já locado.

24 de setembro de 2009

eu daria um titulo grosseiro. eu nao daria bom dia. eu choraria e depois destruiria meu quarto. eu abandonaria tudo. acho que estou te entendendo. sim, foi o que voce sempre quis dizer e eu nunca entedi. mas agora eu vejo, nao há mistério. é o corpo, a vontade e o espirito. o sorriso que sempre nos resta quando temos vida. a musica que nao pára, que na larga, que é bonita sim, tão bonita, e eu nao ouvi!
eu nao ouvi!
nao ouço. sei que está aqui, sei que está tocando. sei suas notas, suas voltas, tudo sei. e nao ouço.
sinto falta de nem sei o quê; que eu perdi, e perco a cada minuto que passo assim. despediço muito mais que o tempo. nao acha?

12 de setembro de 2009

reverso

Você entende, eu sei. Pintei as unhas e escrevo à lápis sobre areia seca e cascas de arvore. Ficou tudo sujo, assim, borrado. Você sabe. Eu sei. Foi reverso, ao contrario. Minha bexiga encheu enquanto eu urinava. Não pude controlar. E agora isso. O esmalte molhado e a areia seca a grudar resistências sobre o meu fazer atrapalhado da vida. Faz tempo. Que não faço algo de que eu possa me orgulhar. Sim sim, é inicio do fim da alma. O inicio do anulamento dela, do querer dela, do pulsar. Essas coisas que acontecem quando chove no verão. E de repente temos frio pois o corpo queimou demais no sol do belo dia que se foi. Se foi. Foi-se. Lá está! Você vê? Ali sobre o mar parado. Se afastando. E aqui uma dor sem fim nem inicio. Quando foi? Que começou? Tudo isso?
Querer apagar-se. Do mundo. Indefeso de mim. Estou aqui para destruir-te, mundo. Sou sua filha ruína. Você sabe. Eu sei. E por isso nos olhamos desse jeito, meio amargo. Reconhecemo-nos logo no nascimento. Sua doença, meu principio; um refluxo do ventre fêmea. Fluxo reverso. Embotei-me ao fazer o mesmo a ti. Tenho você em minhas mãos, prontas para esmagá-lo. Ignorar tua beleza. Para mim é futilidade. Agora, antes não. Apenas agora. Antes era bom. Era claro. Eu sabia, você sabia, o saber do bom agrado ao coração amparado justamente por essa futilidade que agora desprezo.
Não me culpo. Não há espaço para isso. Sou seca. Infértil agora. Não antes. Agora, apenas. Meus dedos gotejam o sangue de seu estrangulamento. O esmalte vermelho da representação de nossos fins amarrados. Enlaçados um ao outro. Gêmeos. Cansados. Eu pari imagens que hoje se dissolvem na maresia triste de Copacabana. Não sou capaz de capturá-las. Deixo escapar. Eu deixo. Elas se vão.

11 de agosto de 2009

Passos largos pela rua escura, com dois ou três bêbados velhos e desconhecidos no bar da esquina. Eles gritam e se divertem, mexendo os braços pra lá e pra cá, e a boca babando uma saliva que eu diria ser de areia.
Como eu, secos. Esgotados pela noite que ainda viria, pouco desinteressados pela vida, mas isso não nunca falariam.
Essa obrigação que se tem de gostar de viver me abateu já há algum tempo. É realmente maravilhoso. Era tudo que eu queria. Sim, a realização de um sonho profundo que eu tinha quando ainda voava acima do universo, e não era conhecida de minha mãe, e esperava.
Todos esses olhos que não sabem de onde vêm, e porquê. Me deprimem quando bebem seus cotidianos. E tentam alienar-se do simples fato de que estão aqui e que não há mais nada a ser feito.
Talvez percamos tempo demais tentando. Talvez seja melhor ir embora. Para a congregação dos espíritos da eternidade. Encontrar velhos amigos, velhos conhecidos, que espero, agora trazem em seus corações pouco mais de paz e consolo para mim.
Ou, não sei, qualquer outra coisa. Qualquer outra coisa. Porque não sou realmente boa, e definitivamente não necessária a qualquer coisa ou alguém, logo, estou livre pra partir. Ninguém é insubstituível, é o que dizem.
O Pai, invejoso, tirou-me a mãe e me jogou num mar de nuvens onde eu sou a Besta que sou. Quero encontrar o que me precede, a forma motora que me impulsiona. No vácuo. E fechar os olhos junto ao corpo todo. Dormir. Voltar ao lugar de onde vim, e pra onde vou, quando eu descobrir o caminho.
Eu não tenho duvida de que estamos todos mortos.
Tem mais vida no saco de pipoca doce que se virou e revirou quando ventava, ontem, no recuo perto da igreja na São Clemente. Só eu vi. E depois o vitral refletiu com santidade as bandeiras coloridas que se agitavam.
É o suficiente. Não há mais nada que falte. Eu estou dispensada.