Em uma cidade do interior de algum lugar, havia uma casa cercada de plantação de brócolis. A família que lá morava não era bem uma família inteira. Uma menina de 7 anos, que cuidava da horta depois de acabar os estudos de matemática e português na escola caindo os pedaços do fim da rua. Uma vovó de 70 anos, que fazia café e bolo todos os dias e passeava pela casa carregando sua pesada idade sobre os ombros frágeis.
Para os vestidos de renda da formosa menininha, a velhinha bordava lindas margaridas amarelas e costurava paetês vermelhos.
Uma certa manha a menina acordou e não tinha cheiro de café e bolo pela casa. A vó estava na cama, encostada sobre uma pilha de travesseiros. Fechada entre os dedos de sua mão direita, um punhado de paetês e linha. Um vestido de bordado incompleto sobre a poltrona do canto do quarto. O sol branco da manha iluminava as rugas macias do rosto da velha. Seus olhos abertos, cobertos por uma gelatinazinha azul, parecia fitar a extensa plantação de brócolis pela janela.
Confusa, a menina senta-se na beirada da cama e aperta levemente a perna da avó, que imóvel permanece. Em meio segundo a informação da morte percorre todo o corpo infantil dessa pequena figura de cabelos despenteados pelo sono recém abortado.
Ela se levanta. Na cozinha o bolo duro e o café frio da manha de ontem. O silencio incomodo cutucava seus ouvidos. Nesta manha ela não iria comer, não iria ao colégio estudar matemática.
De volta ao quarto, seu rosto determinado encara os paetês que brilham, sutilmente, entre os dedos da velhinha. Em três dias ela terminaria o vestido. E no quarto ela prepararia café e bolo. Na quinta tarde solitária sairia pela porta, depois de ter despejado gasolina por toda a casa, e riscaria um fósforo curto. Enquanto a fumaça subia pelas paredes de madeira fraca da antiga casa, a menina, ajoelhada no meio da plantação, arremessava paetês vermelhos ao alto, de bocado em bocado, e o vento os distribuía em uma faixa que traçava o terreno.
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