16 de junho de 2009

*****---------------------------*****foda-se

Me vê, do outro lado da sala. Uso jeans e blusa branca. Descalça. Me olha. Eu olho de volta. Usa jeans e blusa branca. Botas e pêlos para esconder seus anseios. Eu sei. Te olho do outro lado da sala. Esqueci da cronologia. O tempo pára. Os dias param. Fisionomias misturadas. Vozes coro estilhaçam por aí. Assalto ao peito: uma faca! Duas facas! Três facas!
Não, não moço. Esse foi minha mãe que me deu. Me devolve! Eu não vou te dar. Toma aqui outra coisa. Dez reais, toma aqui minha cerveja, meu cigarro. Toma aqui o meu amigo, meu gato. Eu moro ali. Quer levar minha televisão, microondas e som? Leva a minha casa, desgraçado, mas esse aqui não. Esse aqui, moço, esse foi minha mãe quem me deu.
Você sentado do outra lado da sala, enfiou a mão no bolso, cheia dos meus não me toques. Arrancou fibras de osso para me dar de troco. Eu não quero não, seu moço. Eu quero isso aí que você tirou do meu pescoço. Depois você veio com um consolo, que enfiou-me goela abaixo, língua abaixo, até o estômago! Um impostor de recados, de telegramas, de dia e hora, que ignora e se queixa. Um relógio, livro, pingüim de geladeira, alguma coisa mecânica, programada, cínica.
Eu gritei quando você saiu andando e bateu a porta por trás. Eu gritei e você não me ouviu porque estava usando fones de ouvido. E o meu coração palpitando, esmagado no seu bolso, escorrendo, suando. Morrendo lá dentro.
Eu, sentada, do outro lado da sala, usava jeans e blusa branca, e só. Te vi sair e só. Gritei, só. Sorri. Chorei. Fiz o que me foi possível. Minha mão agarrou na garganta e depois escorreu pro peito. Esse eu não quero. Esse eu não quero. E a coisa lá dentro respondia silencio fétido, que eu já conhecia, e que nem um pouco queria.
Esse aqui, moço, eu não quero não.

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