30 de agosto de 2011

E se o dia passasse como os pés descalços no gelo, e quando eu notasse já fosse quase noite quente, e o sono estivesse envolvendo como um amontoado de lenços e folhas? Descanso. Respirar a vida assim, como ela é, que é quase nada. Um sopro da única coisa. Faísca no escuro que nem é escuro. Um antes. Antes de ser.
Antes de ser só há coragem. Vamos irromper na superfície terrestre como uma arvore que cresce, observada pela rocha muito mais estática que ela. As arvores crescem como cachoeiras caem, mas ao contrário. Meu olho é um fóssil que vê o balé de tudo isso. E no fundo da terra meu coração ri, sem saber ser coração de um alguém.
Antes destas mãos, dessa língua, dessa cara, eu sou algo que observa a vida de uma perspectiva muito própria, única. Sou um evento. E cresço e apodreço na mesma duração de um orgasmo.
Ando lutando para que essa foda seja boa.

3 de agosto de 2011

Sem apoio.


Físico. Eu digo que não é nada além de veia, sangue, carne, músculo, pele, osso, e os espaços entre umas coisas e outras.

Na base da coluna passa um ar frio, como se houvesse ali um buraco, vazando espaço, vazio. Aí gela e arde. A base da coluna arde.

Outras coisas apertam. Mas se eu pudesse dizer de outra forma, simbolizar, talvez, sei lá. Talvez eu pudesse entender melhor o corpo por dentro. Talvez pudesse fazer o buraco fechar, pelo menos agora que estou tão aqui querendo me bastar, conter, descansar.

Fazer teoria sobre si mesmo, assim: sou assim por causa disso e sofro quando aquilo acontece. Não vou ali, pois me conheço. Sei que isso é isso e aquilo é aquilo.

Eu não sei. Eu sinto apenas as coisas encostando em mim, saindo, dissolvendo com a musica, com o calor, com os olhos das outras pessoas. Eu peço assim: me dissolve. Me abre espaço, me fecha espaço. Me carrega ou pesa sobre minhas pernas.

Sou um corpo infantil.

Posso dizer: comi caroço de melancia. Tá nascendo uma planta dentro do meu estomago! Não quero que ela cresça. Tenho que parar de pensar nela!

E aqui! Minhas mãos estão descascando, como uma casca de árvore! Sou velha como um carvalho! Eu abrigo passarinhos debaixo dos meus braços. Eles cantam e eu fico feliz.

Meus olhos estão embaçados como os vidros do carro que agora sobe a serra, nos meus sonhos. E meu rosto se contrai, quero ver! Quero enxergar melhor! Quero mexer e saber para onde caminho! Estou tonta. E então eu acordo, era uma fantasia, num país distante, mas ainda assim, não estou livre.

28 de julho de 2011

ESTAVA ALI DE PÉ, OLHOS FUNDOS
NAO SEI MESMO DIZER, ASSIM, MUITO POUCO SÓLIDO
AS MÃOS NOS BOLSOS ESMAGAVAM PÓ DE TABACO

ESSA FIGURA, MARROM E PRETA, O CORPO OCULTO POR BAIXO DA LONA
FOGE DA VISTA
NAO ENTENDO NAO DEIXO ESTAR
QUERO VER
NAO POSSO

MAIS A ESQUERDA,NO CHAO, NO CENTRO
O CORPO DE UMA MULHER BRANCA, DE OSSOS BRANCOS, LISA
A CARNE DORMENTE RESPIRAVA, ALHEIA DE SI
ELA ESFREGA A LONA QUE A RECOBRE O ORGANISMO
O QUE HÁ POR BAIXO DA PELE?
GAIVOTAS, AREIA, O MAR
BREU
VERDADES
A INTENSIDADE LIVRE DE SIGNIFICAR
POR BAIXO DA PELE, CAINDO DENTRO DO PRECIPICIO DA PELE
PULSA FRACO O CORAÇÃO DELA
UM SEGREDO ENVOLVE O CORPO

eu aqui sou duas pessoas míopes

um homem respira pelo instrumento. a porta abre na simultaneidade do torcer da coluna
as duas uma.

na vida é como no amor

8 de junho de 2011

Eu estou sendo suspendido pelo pescoço. A cada quinze segundos, eu tenho um medo terrível de cair. A cada quinze segundos eu tenho que voltar para o lugar onde eu falto. Se tudo flui muito.. eu tenho medo.

30 de maio de 2011

Você vai ter que gostar de mim do jeito que eu sou. Vai ter que gostar.

9 de abril de 2011

Give me death


Para andar nas ruas que eu não conheço, e transar com pessoas que eu não conheço, e me ver de uma forma que eu não conheço, para esquecer os percalços de se saber quem se é, inclusive a idiotice que é isso.

Para beber coisas fortes, para lembrar de Allen Ginsberg, para estar em São Paulo porque lá a selvageria não leva ao mar.

Pra esquecer que amor romântico existe, pra não quer isso, para odiar isso, para nunca nunca lembrar disso

Pra fazer raio x do corpo e ele aparecer sem coração

Para o corpo andar sem coração, para viver sem coração, para ele não conhecer a diferença entre a vida e a morte.

2 de abril de 2011

Encontro a ventania dos olhos. HOJE ACORDEI COM MEDO. Encontro o deserto das mãos. Por trás do raciocínio há uma buraco negro. Penso. Evito o buraco negro. Sorrio e aceno. Lá se vão as pessoas. Agora estou aqui, muito distante. O mundo é mestre em desbancar orgulhos. As espectativas são buracos cobertos de folhas. O andarilho está ciente de nunca mais poder andar: ele segue relembrando a eterna presença do nunca mais. Aliás, podemos morrer, enfim.