21 de abril de 2014

morremos



Morremos. Não mais ansiedade, não mais medo.  Tudo havia saído como esperado, todos nós sabíamos no que aquilo tudo daria. O motivo foi o excesso. Apostamos todas as fichas em um pouco mais de felicidade, sempre um pouco mais de embriaguez, sempre um pouco mais.  Não mais arvore, não mais terra, não mais dia e noite. Morremos. Respiramos fundo demais, nos afogamos em oxigênio. Tudo estava cheio demais de tudo. Não suportamos o tanto. Tanto que não podíamos nem mais dizer o quanto, em uma aspirada boa pela boca e pelo nariz ao mesmo tempo tragamos a terra. A terra dentro de nós não coube. Morremos.  Nada mais de linguagem, nada mais de pausa, nada mais e palavra, nada mais de corte.  Hoje é tudo contínuo. Nada mais. Tempo e espaço misturados, as paralelas se encontraram neste ponto infinito aqui, agora, como suportar a densidade da hora agora do tempo agora do espaço infinito agora do tudo junto? O cadáver. Dentro do cadáver a terra. A terra se refaz, biparte células, cria tudo de novo, ontem e amanhã, no interior do cadáver, entre as costelas do cadáver a árvore. Não mais ansiedade, não mais tempo, não mais pedaço. O corpo humano resiste em sua forma, não explode, sucumbe na tentativa da contenção. Morremos. De tempestade solar, de inundação, de fome, de ressaca. Não mais narrar.

17 de abril de 2014




Lambe lagrima de sal numa bochecha macia
O olho resta aberto contra tudo que não faz mais sentido, como que dormindo e chorando ao mesmo tempo.  Está assim, expelindo sem dar-se conta disso ou do quê.  Aberto, as imagens se esmagam pela Iris, se refazem de cabeça pra baixo na retina, o cérebro transforma tudo em sonho mas eu não tenho acesso. A realidade paira quieta. O olho aberto, lagrima escorrendo, bochecha fria de sal, a língua doce.  Não acontece o que deveria acontecer. O pensamento quieto. a mesma imagem  se esmagando , se refazendo na retina, em algum lugar se faz sonho. Qual?  E os cílios úmidos. E a coisa arrastada, se achata em um sem numero de repetições, um sem hora desse filme mudo e estático. Paisagem do quarto do meio.

absolutamente nada



Estao tao muda. Acho que em primeiro lugar vem a completa falta de inspiração. Uma velhinha me disse que apenas quando o ser está de acordo consigo mesmo é que vem a inspiração. E eu tenho me esforçado tanto para estar, sempre, de acordo comigo mesma. E mesmo assim... o rtimo, a imagem, aquela essencia por trás das coisas, eu já e ainda não a vejo.  me tornei uma pessoa sem direção estética.  Quero re-conhecer minha estética. Será que o primeiro passo é tentar? Hoje cortei o cabelo. Meu cabelo estava horrivel, resultado de uma série de inspirações momentanas sobre o caimento perfeito dos fios. Cheio de pontas. Hoje eu fui ao salão-classe media-copacabana- gay-arrumadinho e agora estou parecendo um poodlle. O home me fez um poodlle. Tenho uma cara formatada de uma moça comum, de lugar nenhum, com umas roupas limpas no armário e nenhum futuro pela frente. Deve ser mesmo a minha cara. O homem acertou. Sou um poodlle. Tenho medo da rua, fico latindo pelos olhos a todos os estranhos dessa grande babilonia horrorosa que é essa cidade. Meu deus, como meus adjetivos são genéricos. O poodlle do sofá, que engorda vendo televisão. O poodlle que não aguenta a propria potencia vocal. O poodlle esperando para dar um passeio. E olha que eu leio... leio buscando a ritmalidade, a essencia a especificidade do momento da narrativa que desvenda a vida. mas nada. Mas nada. Tomo coca-cola. Já não posso dizer que me desfaço, estao bem mais dura, moldada, racional, neurotica. Hoje eu tenho 26 anos. Esse blog tem uns 10 anos. Eu era bem melhor antes.
A coisa de cansar das minhas palavras... qual foi o momento da decepção? Não vieram outras, sabe? Não vieram outras boas palavras. Nem outros bons amores, que são como boas palavras porque fazem a gente amar a vida, a gente sentir que está vivendo. Não veio. Fico paralisada. Esteticamente paralisada. Deus da estética, se voce me ouve, por favor – make me a real boy. O que será que falta aqui? Fazer da vida uma experiencia estética, Oiticica, fazer da vida uma experiencia estetica como fazer da vida uma experiencia estética, como fazer estetica oitica o que fazer? Da costela pra fora. Tem cheiro de coisa vazia. Mo-sai-co. mos-aic-o. m-os-ai-co. estou só. Isso é estar só. A linguagem salva-nos da solidão. A vida tem que ser comunicada, mesmo que a nós mesmos. Eu estou na vida, e não posso comunicar. Mas é porque não sinto!! Não sinto.  Esse mosntro do nada é bem maior do que eu podia imaginar. Eu achava que estava no nada, mas eu estava era observando o nada. Eu o observava, eu descrevia, eu o via se mecher e achava que estava no nada. Mas não estava. No nada eu estou agora que não tenho absolutamente nada a dizer. Absolutamente nada.

11 de novembro de 2013

Deserto



Amolece,
Aos poucos sou capa dez ver que atrás da próxima cortina há um brilho
Não sei, acho que é o vento que me conta
e o calor
que as famílias são miragens dessa sociedade
após o grande dilúvio elas restarão como estatuas enterradas nas areias de um deserto
porque os mortos nunca vão embora.
nas casas da cidade, todas assoladas pela espera e submersas em brisa quente, as pessoas estão rodeadas de fantasmas.
Seus nomes surgem na hora do jantar, seus objetos pulam de dentro das gavetas, seus hábitos pousam de surpresa sobre os dedos dos vivos
Olha no espelho, veja seu rosto
Conversa com o fantasma que te guia.
Ouve a palavra que desvenda muito mais o futuro que o passado e denuncia mais a vida que se tem que a morte que o levou um dia de perto de você.
Agradece o fantasma que te constitui. Agradece ao batom do fantasma que ficou marcado na sua bochecha.
Reconhece a presença. Quando sair, acene e deixe uma luz acesa.

11 de outubro de 2013

não conseguir dar conta
na linguagem
quer dizer
que a linguagem é pouca
ou que a conta é alta?

desenhar "deus do vento"
pode suspender dois ou três anos
e fazer confundir pernas cansadas
com depressão

a insegurança que sabe some
já que não há chão



encontrou um pedaço de bomba de efeito moral
na calçada da rua do passeio
guardou na bolsa
e leva consigo até hoje
como patuá
protetor dos verdadeiros amantes

8 de outubro de 2013

antiqua



A escrita tem o tempo urgente. Precipitação instantânea desse orvalho mental, amorfo, denso. E eu acredito que ela pode me salvar. A linguagem pode me salvar. Por isso escrevo. E sempre que escrevo preciso definir seu motivo, seu destino, sua função. E ultimamente tenho gana de rimar, a coisa que acho mais brega. é convivência. Tenho muito medo do costume porque minha alma é naturalmente obediente. Se as hastes não me agradam eu fico é triste e só. Invejo os olhos rebeldes, os espíritos atenciosos, denunciativos. E no entanto, me envolvo sempre com o indizível e o que me faz ainda mais plasma. Porque dizer é o que dá o contorno e ei já nasci borrada, amo a borra, gosto do incompletamente dessignificado, antes, o pré, o tal orvalho.

Ontem havia um homem.  Não quero descrevê-lo. Havia ele na minha frente como uma promessa de uma vida paralela, cheia de sentido só pra mim. Ontem havia um homem. Hoje a casa é habitada por fantasmas femininos. Mas como fui tola em não perceber que atrás de um pai sempre existe uma mãe deprimida.

E no meio de tudo isso eu me lastimo da minha indefinição. Houve um instante em que eu fui menina, de rosa, de fralda, querendo aquele entre-pernas cabeludo. Já está realizado, pronto, em quase cada cama que me deito. Que susto dizer isso. Mas o pai já se foi, restam os estudos financeiros para comprar um computador, para comprar aquele livro que desvendará o sentido.  

Que mal que é esse dia em que me confronto com minha forma. Tomo 5 banhos, fazendo escorrer uma graxa, na esperança de que ela me revele a estampa que é minha finalmente  e eu não sabia. Mas minha pele cisma em se esfarelar.
É uma tremenda falta de assunto.  É uma tremenda falta. De assunto. Falar de pele e de pai. como se essa. Fosse a única. (e é). Linguagem possível. Para um ser humano como eu.

Eu me lembro de ter saído de uma enfermaria. Eu fui parar lá porque tinha mergulhado num poço de águas muito escuras, um poço escuro, cheio de folhas mortas das arvores que cobriam esse poço. E eu me lembro que a água era gelada e, quando eu mergulhava, eu tinha memórias muito intensas, de uma cidade que eu nunca vi, de uma menina de camisolas que eu nunca vi, de uma tarde se pondo no tapete da sala da minha casa, de uma estrada beira-mar, coisas desse tipo. Pois depois que eu mergulhei e lá fiquei, porque pensei demais nas lembranças, tanto que não consegui me concentrar em nadar e respirar. E quando eu pensei que eu já tinha morrido, lá embaixo do poço, misturada na sedimentação das folhas dessas árvores de cima, aí me pegaram de lá debaixo. E quando eu voltei pro chão – espalmei minhas costas naquela pedra molhada cheia de terra – e olhei pro céu, eu percebi que eu não podia mais sorrir, e que alguma coisa tinha acontecido que eu não entendia mais as coisas que as pessoas falavam, e parei de sentir também a direção da vida dentro de mim – o que se chamamos de desejo.
Foi então que eu fui parar na enfermaria.

E la na enfermaria aconteceu aquilo tudo – das horas, das roupas, das escolhas sem sentido e de suas importâncias, do sapato amarrado, da comida, da sequencia. Principalmente da sequencia das coisas, que uma coisa levaria a outra e que era por isso que eu precisava ficar acordada. Enfim. Um monte de coisas que hoje eu posso dizer que eu não sei aonde foram parar.

Mas o fato é eu fiquei muito tempo lá de forma que eu acabei de refazendo – andando mesmo, dando sequencia. Apesar de eu nunca ter esquecido que muitas, muitas coisas mesmo não tem sequencia e não é por isso que elas não existem.

E então eu fiz tudo como tinha que ser, mas uma coisa não aconteceu mais. As lembranças deixaram de vir. 

Eu entendo hoje como uma obliteração da presença íntima. Não é mais possível narrar minha vida como eu antes fazia. E é aqui que eu queria chegar – que não é mais possivel pra mim narrar a minha vida.
E o que isso significa, na pratica, é que quando eu não posso narrar a minha vida, em primeiro lugar, a linguagem esmorece. Eu tento resgatar e esse é meu caminho narrado. Nessa extrema necessidade e dificuldade.